O caso ABDI mostra quem Cappelli realmente é
Investigação no TCU aponta possível uso da máquina pública e acende alerta sobre ambições de poder
A investigação aberta no Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a atuação de Ricardo Cappelli à frente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) não pode ser tratada como um detalhe técnico ou um episódio isolado. Ela revela um padrão de comportamento que preocupa e que precisa ser encarado com seriedade pela sociedade, especialmente diante das ambições políticas atribuídas ao atual presidente da agência.
O que está sob apuração é objetivo e grave: indícios de desvio de finalidade no uso de recursos públicos, por meio de um contrato de publicidade da ABDI que chegou a R$ 8,1 milhões. Segundo o relatório técnico do TCU, parte desses recursos pode ter sido usada para impulsionar conteúdos em redes sociais com foco na promoção pessoal e política de Cappelli, sem relação direta com as finalidades institucionais da agência.
Entre agosto de 2024 e outubro de 2025, foram identificados centenas de impulsionamentos pagos, com gastos estimados em até R$ 220 mil, além da possível participação de servidores e terceirizados da ABDI na gestão desses conteúdos. Se confirmados, esses fatos configuram algo muito mais sério do que falhas administrativas: indicam o uso da estrutura estatal como ferramenta de construção de imagem pessoal.
O ponto central não é a defesa ou acusação antecipada, mas o princípio violado. O gestor público não é dono da instituição que comanda. Ele é apenas um administrador temporário, submetido a regras, limites e à obrigação de agir exclusivamente em favor do interesse coletivo. Quando esses limites são testados ou ignorados, abre-se espaço para abusos maiores.
Cappelli afirma que não houve irregularidade e que sua comunicação pessoal não se confunde com a da ABDI. No entanto, os indícios apontados não surgiram do debate político, mas de uma análise técnica de um órgão de controle, cuja função é justamente fiscalizar o uso do dinheiro público. Tratar isso como perseguição é uma estratégia conhecida, mas insuficiente diante da gravidade dos fatos em apuração.
A preocupação aumenta quando se observa o contexto político. Um dirigente que, segundo o TCU, pode ter permitido ou se beneficiado da mistura entre comunicação institucional e autopromoção não transmite segurança para comandar uma estrutura muito maior, como um governo estadual ou distrital. Governar exige mais do que discurso; exige disciplina ética e respeito absoluto à separação entre Estado e projeto pessoal.
O Distrito Federal já enfrentou crises profundas causadas por gestores que confundiram poder com propriedade. As consequências foram desastrosas: descrédito, desperdício de recursos e danos à confiança da população. Ignorar os sinais agora seria repetir erros já conhecidos.
O processo no TCU ainda terá desfecho, e o direito à ampla defesa deve ser respeitado. Mas a política não pode esperar apenas sentenças para fazer juízos de responsabilidade. Indícios sérios exigem cautela, vigilância e posicionamento claro da sociedade.
Quem pretende governar precisa demonstrar, antes de tudo, compromisso inequívoco com o interesse público. O caso da ABDI lança dúvidas legítimas sobre essa disposição. E quando o gestor testa os limites da máquina pública, é o cidadão quem acaba pagando a conta.

